Exmo. Senhor Presidente da Câmara,
Dr. António d'Orey Capucho
Em relação ao anunciado "Plano de Pormenor de Reestruturação
e Urbanização do Terreno do Hotel Miramar", e porque aquela zona representa o muito pouco que ainda resta do Monte Estoril
original, e não queremos que o futuro Miramar se torne na sua machada final, vimos junto solicitar a V.Exa. que
nos esclareça o seguinte:
1. Como é do conhecimento de V.Exa., o Hotel Miramar encontra-se
em ruínas desde 1975, altura em que ardeu na sua quase totalidade, embora muito do seu estado actual em ruínas se deva à progressiva
degradação, ao vandalismo e ao abandono a que foi votado pelos seus proprietários e pela CMC, ao longo de mais de 30 anos
(!), sem que quem de direito interviesse a fim de fazer cumprir a lei. Como foi isso possível?
2. Como é também do conhecimento de V.Exa . o Miramar foi sempre
considerado um dos hotéis mais míticos da Linha, não só por força da popularidade que gozou ao tempo do Casino Internacional,
como pelo palacete e jardins de típica arquitectura de veraneio de finais do séc. XIX , da responsabilidade do Eng. Almeida
Pinheiro, e de que os registos à época e as fotos em anexo (das actuais ruínas) são a melhor prova. Portanto, não compreendemos
nem aceitamos as declarações do Sr. Arqº Gonçalo Byrne, quando diz "não encontro valor no que está ali".
Imóvel que, recorde-se, está incluído no inventário da Direcção
Geral do Monumentos Nacionais e Edifícios e no Catálogo-Inventário do actual PDM. Para além disso, é menção obrigatória em
todos os trabalhos académicos e culturais sobre a zona. Dado o estado de degradação do imóvel, presume-se que grande parte
do edifício terá de ser demolido para posteriormente ser reconstruído, mas apenas isso: reconstrução.
Mais grave é o silêncio face às duas torres do hotel, as quais,
ao contrário do resto do edifício, que é feito de tijolo; são feitas duma pedra muito rara e típica da primeira fase da urbanização
do Monte-Estoril. Elas aparentam estar estruturalmente sólidas e estáveis. A sua demolição seria um erro grave, pois o construtor
nunca conseguirá reconstruir as torres com o mesmo aspecto. As pedras são únicas e, muito provavelmente, já não se conseguirá
encontrar mais desse género.
3. Entendemos, por isso, que o que deve ser promovido é a
reconstrução do Hotel Miramar, tal como era em 1975 , e não o "Plano de Pormenor de Reestruturação e Urbanização do Terreno
do Hotel Miramar", cuja designação, em si mesmo, apresenta duas contradições significativas, a saber:
a) "Plano de Pormenor"
Como é do conhecimento de V.Exa., sob este instrumento, designadamente
na modalidade de "regime simplificado", se tem vindo a permitir as mais variadas barbaridades do ponto de vista urbanístico,
ambiental, etc., servindo este instrumento apenas de expediente legal para se contornar o PDM, sobretudo naquilo que ele comporta
em termos de interdição de ocupação de logradouros com construções ou pavimentos permeáveis, inclusive estacionamento subterrâneo.
Ora, de acordo com o PDM actualmente em vigor, e antes de ter
sido criado o Plano de Pormenor para o local, o lote em questão estava classificado como zona urbana de baixa densidade e
o logradouro como zona urbanizável de baixa densidade (referência altamente discutível, aliás). A construção de um hotel com
100 camas não respeita esse indicie de baixa densidade.
b) "Urbanização do Terreno"
Não compreendemos, por isso, como tem vindo a CMC a congratular-se
com a "recuperação do Miramar" (havendo até declarações emotivas de parte a parte, aquando da assinatura do protocolo 1117/2005),
para, depois, a "recuperação" ser, tão somente, a construção de raiz de um novo edifício, ainda para mais ocupando a totalidade
dos cerca de 0,6 ha da propriedade (ver maqueta), e demolindo-se o que resta do Miramar (as tais ruínas "sem valor"), fachada
incluída, presumimos, exactamente a mesma em relação à qual a CMC se manifestara como sendo a "preservar".
4. Parece-nos também abusivo que um hotel que tinha 40
quartos à altura do seu incêndio, se transforme agora, à luz de um protocolo, num empreendimento hoteleiro com 100 quartos
(!), transvazando o conceito internacional de "hotel de charme", e 400 empregos directos, o que significa que, mais uma
vez e à semelhança da Vila Montrose, não só estamos perante um atentado ao equilíbrio urbanístico (hotel com 100 quartos em
0,6 ha?) em zona extremamente sensível, como teremos um forte impacto a nível:
a) Ambiental - O Hotel Miramar tem hoje, aproximadamente,
5.000 m2 de logradouro. Nesse logradouro existem inúmeras palmeiras centenárias, um enorme pinheiro manso e várias outras
árvores de grande porte. O logradouro do Hotel Miramar, juntamente com o enorme jardim da Vila Abamonte e os jardins das outras
moradias torna aquela zona num enorme espaço verde que é visível não só da Avenida Marginal mas também para quem entra no
Monte-Estoril vindo da Av. D. Nuno Álvares Pereira.
Existem vários reclames publicados pelo Hotel Miramar no inicio
do século XX, que salientam o facto do hotel ter um grande jardim - "Surrounded by a large Garden, Beautiful view over
the Sea". Ora, o hotel já perdeu a "beautiful view" por causa do Hotel Atlântico em frente, e agora vai perder
o seu outro atractivo, o "large garden". Parece-nos que o hotel teria muito mais "charme" com jardim do que sem ele.
b) Trânsito e estacionamento - Com a criação de 440 empregados
e uma estimativa de ocupação de centenas de hóspedes, passariam a circular nas ruas estreitas que circundam o Miramar (ruas
que, atente-se, deviam ser pedonais!) mais automóveis e, inclusive, autocarros. Há algum estudo de impacte sobre este assunto?
c) Visual – É de prever que o futuro
complexo hoteleiro imponha um corte radical com as pré-existências vizinhas, deitando a perder o que resta da sua coerência.
Entre elas está um dos edifícios mais notáveis da arquitectura de veraneio dos Estoris, cuja importância extravasa o próprio
concelho: o chalet que originalmente pertenceu a Manuel Duarte, um dos primeiros no País nos quais se utilizou ferro e vidro
em portas e janelas. O seu desenho, fortemente influenciado pela arquitectura cemiterial da época, faz dele também um exemplo
raríssimo da sua aplicação a usos residenciais.
d) E, eventualmente, sobre as estruturas dos prédios vizinhos
(há algum estudo de impacte?).
5. Estranhamos que, para a CMC, pareça ser mais importante
a viabilidade económica de um projecto de um promotor particular, cedendo aos argumentos do promotor (é usual os hoteleiros
apontarem como meta os 100 quartos de ocupação como garantia da viabilidade de hotel em zona central), do que pugnar pela
preservação do equilíbrio urbanístico do Monte Estoril e com a imagem romântica que, paradoxalmente, utiliza como argumento
turístico.
Porque não aplica a CMC, finalmente (!), o Plano Integrado de
Requalificação do Monte Estoril, de 2002 (https://cidadaniacsc.tripod.com/AMMEPIRME.pdf )?
Porque não segue a CMC as recomendações dos pontos 4.c.3 , "seja
impedido todo e qualquer abate de árvores" e ponto 4.c.6, "se estabeleçam regras de circulação automóvel"? A necessidade de
se combater a "massificação construtiva"?
Pedimos que a CMC recupere o património do Monte, preserve as
massas arbóreas (na sua maioria centenárias), condicione o trânsito, discipline o estacionamento.
Finalmente, pedimos a V.Exa. que ponha termo à ideia feita circular
pelos promotores imobiliários de que é possível repor coberto vegetal em terrenos impermeabilizados com cimento. Isso é falso!
Creia-nos, imbuídos da mais sincera das cidadanias.
Na expectativa de que esta exposição sirva de alerta aos males
que advirão para o Monte Estoril, para os que lá moram e os que visitam o nosso concelho, no caso do supracitado plano de
pormenor ir avante conforme tem vindo a público, subscrevemo-nos com os melhores cumprimentos
Paulo Ferrero , Vasco Stillwell d'Andrade, Diogo Pacheco
de Amorim, Maria Amorim Morais e Maria José Ravara